Mistura de “costume” com “play”, cosplay é, literalmente,
brincar de se vestir. Após ter a ideia inicial, arranjar tempo para correr
atrás de perucas, acessórios e afins, tão caros, raros e transtornados para
serem enviados por correio... Enfim, após todo o trabalho e dedicação que dá
produzir um cosplay daquele personagem que amamos ou simplesmente achamos
legais, só o que queremos e esperamos é a diversão que traz o brincar. Infelizmente,
no entanto, esse significado tão simples e puro tem se perdido.
Acho que isso não é novidade para ninguém, mas existem youmas extremamente enraizados na nossa sociedade, como a intolerância, o machismo, o racismo e o desrespeito, e como nós fazemos parte dessa mesma sociedade, tudo isso se reflete quando o assunto é cosplay. Como seria maravilhoso se todos que não podem ir de carro não precisassem se trajar inteiramente dentro dos eventos, mas não podemos sair na rua com nossas fantasias sem receber críticas, xingamentos ou até ameaças de pessoas completamente estranhas palpitando sobre nossas vidas (quem nunca ouviu, pelo menos, isso: “o carnaval já passou!”?). Isso quando as pessoas que conhecemos, como colegas ou mesmo familiares, acham que somos loucos ou imbecis. E como se isso já não fosse pouco, as cosplayers ainda precisam lidar com homens sem noção que se dão a liberdade de assediá-las, sejam eles repórteres, pessoas que tiram fotos e mesmo os próprios cosplayers, e aí entramos na parte mais chata: não só a mídia e as pessoas “não-otaku” que nos atacam, mas também nós mesmos nos atacamos.
Se fazemos um cosplay de um mesmo personagem que outros estejam fazendo, somos logo recriminados pelos mais “bem produzidos”. Falando nisso, qualquer peça que possa estar minimamente diferente da personagem original ou produzido com recursos limitados, somos logo rebaixados, taxados de “cospobres”. E nem tente fazer um cosplay de uma personagem diferente de você! Negro não pode fazer cosplay de personagem branco, mulher não pode fazer cosplay de personagem homem, gordos não podem fazer cosplay de personagens magros, e por aí vai. É como se tivéssemos de estar idênticos. Gente, isso não é obrigação! Lembrando: “cosplay” pressupõe brincadeira, não as pressões do mundo da moda. Mas são essas as pressões que estão cada vez mais presentes nos concursos de cosplay, aonde os próprios participantes vêm se mostrado desonestos com seus colegas. Competitividade, descriminação, objetificação... Está bem claro que o universo cosplayer se mercantilizou, o que não é tão absurdo visto que cada aspecto da nossa sociedade como um todo é atualmente regido pelas regras do mercado e do capital.
Dizendo tudo isso, parece até que estou dizendo que fazer
cosplay só nos traz desgraça, que deveríamos largar esse hobby, que o mundo é
um horror, mas não é nada disso. Ainda com tantas adversidades, todo o processo
de montar e vestir um cosplay nos trazem um infinidade de coisas lindas. Desde
habilidades artesanais e de organização até de pensar e sentir como se fosse
outra pessoa (no caso, a personagem), e isso nos ajuda a desenvolver nossa
empatia, e com ela mudamos nossas próprias atitudes. Por exemplo, ao
encontrarmos outro cosplayer com a mesma personagem, rir e tirar foto juntos ao
invés de brigar; ao invés de diminuir outro cosplayer por sua fantasia
obviamente não ter custado tanto dinheiro, parabenizá-lo por sua criatividade
de fazer algo com tão pouco. E principalmente: a alegria que sentimos quando
pessoas querem tirar fotos com a gente, quando fazemos amizades, quando nos
sentimos mais livres de nossos bloqueios internos... Embora o mercado tente
colocar um preço em tudo que toca, essas alegrias, tão especiais para nós
cosplayers, jamais terão preço.